sábado, 31 de julho de 2010

Atlatl

Atlatl: dispositivo paleolítico das armas de arremesso, que utiliza a alavancagem com o objectivo de atingir um maior alcance e precisão

Infelizmente para a população de Foz Côa, as gravuras paleolíticas serviram fundamentalmente como arma de arremesso político para diferenciar os dialogantes políticos da equipa rosa dos acéfalos calculistas da equipa azul (ver aqui uma descrição mais aprofundada sobre estas duas equipas). Mira Amaral, o ministro da Indústria do governo de Cavaco Silva, nunca ultrapassou o facto da construção da barragem ter sido suspensa em Novembro de 1995.
Cinco anos após a polémica mediatização das gravuras, estive em Foz Côa, devido a um projecto de estudo na região do Alto Douro. Para além de recomendar a visita ao vizinho Parque Natural do Douro Internacional, consegui ainda ter a oportunidade de apreciar as ditas gravuras in loco.
Aqueles que estiveram comigo são as únicas pessoas que eu conheço que as visitaram, pois a acessibilidade ao local é precária e todas as visitas são acompanhadas por um guia, que ajuda os leigos a perceberem a diferença entre um auroque e uma cabra.
Apesar da voragem mediática da altura, o marketing cultural podia ter sido mais bem explorado (descontando aqui o travo suave do "Arte do Côa", que acaba por nem ser muito mau, se não for comparado com o superior "Freixo de Numão").

Apesar da paisagem magnífica do vale do Côa, este apresenta-se desvalorizado pelo facto da barragem se encontrar já metade construída e não ter sido demolida (talvez a pensar em melhores tempos). Como quase tudo o que (não) funciona neste país, o governo de António Guterres foi pródigo, nesse aspecto tão português, de deixar tudo em banho-maria e tentar agradar a todas as partes possíveis, para existir um mínimo de contestação social. Deixando qualquer tipo de decisão importante para as calendas, na esperança que o povo em geral se esqueça do motivo por que se queixa.
Não existe razão objectiva para a infraestrutura hidroeléctrica estar ainda de pé, submergindo cerca de 90% das gravuras existentes. Bem como o facto de ao seu lado funcionar uma pedreira que efectua descargas de material para dentro do parque arqueológico. Bem sei que se impedissem o funcionamento da pedreira, estariam em causa postos de trabalho numa região onde eles são cada vez mais escassos. Mas não se pode defender publicamente um projecto cultural, e depois deixar que esse mesmo projecto seja destruído aos poucos, numa tentativa de agradar a todos.

O Museu do Côa foi inaugurado com pompa, por um discípulo de Guterres e por uma ministra que, não obstante a sua sensibilidade criativa, resolveu ignorar as questões mais importantes (pelo menos na minha opinião) mencionadas acima e relevar o facto da Humanidade não conseguir viver sem estas gravuras.
Apesar de que, tão importante projecto para o desígnio da Humanidade, não desviar um euro de derrapagem por parte do Estado Português, omitindo o facto de que, uma vez não existindo dinheiro inicialmente para o projecto, os gastos conseguirem ser muito mais comedidos. Este último motivo a contribuir bastante para o facto do museu só agora ter sido inaugurado.

Imagem daqui

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