quarta-feira, 30 de março de 2011

Santa Eugénia

Eugenia Diordiychuk

As ucranianas são boas e a Eugenia começou por ser um fenómeno de Internet, onde era conhecida pelos "aliases" de Jenya D. ou Katie Fey; este último nome saído da imaginação delirante de um pornógrafo americano, talvez devido ao facto de ser fisicamente parecida com a actriz Katie Holmes.
Vale a pena ver a bela peça de filosofia de entrevista onde ela afirma que quem deve cantar são os cantores, quem deve dançar são os dançarinos, quem deve representar são os actores, e os modelos devem simplesmente modelar. Considerações éticas à atenção de muito boa gente.

Também pode ser adaptado ao que fazemos, uma vez que os bloggers deveriam simplesmente blogar (será que este termo existe?) e deixarem a escrita de livros para os escritores. Mesmo que tais bloggers tenham conceituados editores livreiros a lavarem-lhes o rabo com água de malvas.


Entrevista de Eugenia Diordiychuk

segunda-feira, 28 de março de 2011

Hoje acordei mal disposto

Eu sei que os blogues de direita andam todos entesados com o facto dos seus donos poderem chegar ao poder, e que certos jornais e televisões impingem sem pudor uma mensagem sebastianista que eu não desejo comprar.
Mas de facto, porque razão haveria de existir pudor? Se todos sabem qual é a mão que lhes dá de comer. Em relação à bloga, moderem os vossos ataques pessoais. Discutam ideias em vez de agredirem os olhos e a inteligência das pessoas que passam pelas vossas lixeiras. Tanta contaminação mete medo.
O ataque mais cobarde é feito a Paul Krugman. Economista norte-americano que na opinião dessa gente, se trata simplesmente de um "adivinho" que nunca deveria ter recebido o prémio Nobel. O objectivo é atacarem, por interposta pessoa, o suposto sustentáculo ideológico do partido do governo.
Krugman é Neo-Keynesiano, e eis o que escreve acerca do ataque que o próprio Keynes havia sofrido às mãos dos conservadores:
«A hostilidade maior a Keynes, porém, sempre partiu da direita. Porque será que os conservadores detestam a economia keynesiana? Em parte porque não gostam de Keynes, o homem - esteta, homossexual e membro do temível grupo de Bloomsbury»

O grupo de Bloomsbury era um grupo de intelectuais londrinos da primeira metade do século vinte, entre os quais se encontravam os escritores Virginia Wolf, Edward Forster e o próprio John Maynard Keynes, e que tinham ideias e atitudes modernistas em relação a temas como o pacifismo e a sexualidade.
Mais adiante, Krugman aponta o facto da direita intelectual ter conseguido encontrar argumentos para criticar a esquerda intelectual durante um certo tempo:
«Falando agora com mais seriedade, os conservadores não gostam de Keynes porque ele parece justificar na sua teoria, uma ampliação do papel do Estado. A teoria de Keynes sobre a recessão vê esta como uma situação em que os mercados privados estão metidos num emaranhado que a acção estatal pode ajudar a desembaraçar. Ele próprio não era socialista, muito menos a maioria dos seus seguidores; para eles, essas ideias eram uma maneira de fazer o capitalismo funcionar melhor, não uma razão para substitui-lo. Contudo, os conservadores sempre encararam a economia keynesiana como a ponta de lança de uma teoria que permite a intrusão total do Estado no mercado, e têm procurado alternativas e formas de refutar o keynesianismo.»
Paul Krugman, “Peddling prosperity: economic sense and nonsense in the age of diminished expectation”, 1994.

Aqui d'el Rei! Que o Estado está gordo, e é necessário privatizar para que muitas negociatas sejam feitas para os seus apaniguados. Alguém que faça o favor de limpar a saliva nos cantos da boca a essa gente. E uma vacina contra a raiva também não era mal pensado!

domingo, 27 de março de 2011

Pesadelo trans-dimensional

O grupo de místicos que encontrei eram pessoas da minha idade. Todas elas capazes de verem os espectros e as várias confluências caleidoscópicas da realidade. Diziam-me que se conseguisse entrar em contacto com os seres angélicos que flutuavam por cima de nós, então conseguiria rasgar as cortinas que me impediam de observar esses mesmos espectros que o comum dos mortais não vê.
Ao descer por uma avenida bastante diferente daquela que existe na realidade, cujos edifícios futuristas me fizeram pensar que algo teria acontecido, encontrava-se tão leve o meu corpo, que eu como que flutuava por cima dos carros estacionados, até que finalmente o nosso grupo chegou ao local onde eu iria tentar quebrar os véus da realidade. O local era um grande edifício ermo e um velho artesão encontrava-se a laborar num nicho da entrada.

Eu e o referido grupo entrámos e subimos lentamente umas escadas. Sentei-me de pernas cruzadas numa das salas, um hall amplo, e preparei-me para entrar em transe. Ao fim de alguns momentos a meditar, o meu espírito e supostamente o meu corpo, entraram noutra dimensão, de onde os místicos pareciam ter desaparecido.
De facto, o meu corpo estava ainda na sala, mas em transe, ao mesmo tempo que a minha mente assumia o controlo de um corpo igual ao meu, que estava numa sala igual aquela que tinha deixado, embora nesta nova sala ninguém me rodeasse. Parecia que ninguém existia nesta realidade, tão semelhante, e ao mesmo tempo tão diferente daquela onde eu tinha deixado o meu corpo físico.
Tentei perceber onde estava, mas o facto de me encontrar sozinho ia-me deixando cada vez mais apreensivo.

Nesse momento, começa a tocar um telefone que se encontra na sala. Resolvi atender, embora desconfiasse que seria algo estranho, pois sabia que me encontrava numa dimensão paralela aquela onde se encontrava o meu corpo, rodeado do grupo de místicos.
Ao telefone, uma voz imperceptível ia-se tornando mais clara à medida que me ia relatando algo que iria acontecer.
Após o telefonema, tentei subir para cima de uma clarabóia para descobrir se conseguia rasgar as cortinas que me impediam de ver os espectros. Ao rasgar as cortinas vi que os espectros tinham assumido o aspecto de uma nuvem de fumo. Foi nessa altura em que caí de costas e acordei pesadamente na minha cama.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Parecem Hollows, mas não são!

O gambito, segundo escreveu Henry Miller, é um tipo de salto no escuro com pernas mecânicas. Uma jogada de xadrez onde se sacrifica algo, para se ficar numa posição mais favorável.
Sócrates tem a noção que se conseguir passar o ónus todo para a oposição, ou pelo menos parte dele, poderá ganhar as eleições. Passos Coelho deve ter pensado que, sem ser a altura ideal, na falta de melhor, é uma boa altura para avançar. Mas só depois de se ter reunido com Cavaco, o seu guia espiritual, é que provavelmente tomou esse tipo de atitude.
Acho que estiveram todos mal. Anda tudo a salivar com eleições, mas esquecem-se que o futuro eleito vai dizer que o país bateu no fundo e irá aplicar as mesmas medidas deste governo ou piores.
Este tipo de políticos só se preocupa com a imagem pessoal. Não existem máquinas de propaganda suficientes que tranquilizem a população a ter de escolher entre um mentiroso e um hipócrita.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Chuva ao entardecer

Artur Agostinho (1920 - 2011) fotografado por João Girão

Pensei um bocado antes de escrever sobre Artur Agostinho. Parecia-me que qualquer coisa que escrevesse estaria carregada de lugares-comuns e frases feitas. Como dizia um amigo meu, nunca se lhe ouviu um balbuciar, a sua voz não hesitava e a sua mente estava sempre em movimento. A verdadeira essência da comunicação é mesmo assim, a linguagem deve ser inteligível e nunca se deve deixar o discurso em suspenso.
Mas um tipo de comunicador como o Artur pertence a uma era romântica, em que existia tal figura cavalheiresca e imbuída de desportivismo. Hoje em dia, poucos sabem o que isso significa.

Imagem: Arquivo DN

terça-feira, 22 de março de 2011

Utensílios de banho

Danni Cole, fotografada por Ron Harris

O desodorizante em roll-on preferido pelo consumidor feminino varia entre o Sensitive da Rexona Women e o seu clone da Dove, devido mais à forma ergonómica dessas embalagens do que propriamente pelo seu efeito refrescante ou anti-transpirante.
No caso das senhoras que sejam as felizes proprietárias de um massajador facial, o referido formato das embalagens já não é assim tão importante.

domingo, 20 de março de 2011

Interceptores de fim de inverno

Eu sei que não são interceptores, são caças de supremacia aérea. Mas eu sou antiquado, e estas reminiscências da guerra fria dão-me ponta e orgasmos. Os Mirage e os Rafale são máquinas infernais. Foi a mão do diabo, e não a de Marcel Dassault - agora já sei o que significam as iniciais MD - quem desenhou aqueles aparelhos.
Caso Gaddafi e Sarkozy ainda se falassem, o líbio poderia dizer-lhe que este tipo de armamento não vale. Que é anti-jogo. Isto depois de ter financiado a campanha eleitoral dele. Há políticos ingratos, que já nem se deixam comprar como deve ser.
A estratégia das nações ocidentais consistiu em deixarem os líbios tentarem resolver aquilo sozinhos, após a agitação que os vários serviços secretos instigaram no terreno. Como os rebeldes não o conseguiram, que isto de combater nas areias da Líbia só o Rommel é que sabia, optaram pela fase seguinte, enquanto bombardeiam Tripoli e salivam com os poços de petróleo.
Deve ser da lua, que está cheia e no periélio, ou então do equinócio.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Da ignorância

Parece que existe uma postura anti-recenseamento, devido a uma pergunta que pede aos entrevistados que estejam a trabalhar a recibos verdes, mas por conta de outrem, que assinalem a opção de que estão a trabalhar por conta de outrem. Fez-se uma teoria da conspiração em torno disto, que o governo quereria ocultar o número de pessoas que trabalham com falsos recibos verdes. Ora, eu gosto de teorias da conspiração - são engraçadas e tal - mas tenho pouca paciência para a demagogia, especialmente quando implica burrice ou má fé jornalística.
Em primeiro lugar, quero deixar bem claro que um tipo de recolha estatística como o recenseamento da população é um método arcaico de recolha de informação, e esta só é fidedigna se contar com a colaboração dos envolvidos e a máquina recenseadora estiver afinada o suficiente para lidar com os eventuais erros que fatalmente irão surgir numa operação a esta escala.

Uma amostragem da população, através do método de inferência estatística, como se faz por exemplo nos Países Baixos, seria uma alternativa bem mais barata, e com resultados práticos semelhantes. Mas pelos vistos, o nosso país gosta de gastar dinheiro.
A segunda crítica que faço ao Instituto Nacional de Estatística (INE) - abençoada seja a sua negra alma - é a postura inerente aos seus académicos e publicitários, que julgam que o país onde vivemos é bem diferente daquilo que ele de facto é. O filme publicitário dos Censos de há dez anos atrás, dava a imagem de um país sofisticado, quase nórdico, onde não existiam dez por cento de analfabetos e cinquenta por cento de iliteracia entre a população.
A falta de sorte dos Censos 2011 é a sua realização numa altura em que já ninguém acredita nas instituições nacionais, muito por culpa do abuso que os políticos foram fazendo delas ao longo do tempo, e que contribuiu para uma degradação da sua credibilidade.

O objectivo dos Censos não é o de resolver o problema dos recibos verdes, ou o dos falsos recibos verdes. O objectivo do INE é providenciar informação estatística de qualidade, para que demógrafos, geógrafos, sociólogos, técnicos do território e de programação de equipamentos, possam trabalhar.
Trabalho este, que se destina a aumentar a qualidade de vida da população que é inquirida. O abuso dos recibos verdes deve ser resolvido pela justiça e a sua existência pelo poder político. Tudo o resto é demagogia, baseada na ignorância, ou uma tentativa de atirar areia para os olhos das pessoas, aproveitando a fama controladora deste governo.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Espremer até à última gota

Feliz dia de São Patrício. O santo que baniu todas as serpentes, um símbolo dos druidas, da Irlanda. Medo. Vamos ao bar irlandês, aquele que fica a seguir ao salão helénico, antes da casa de flamenco. Ide pois, buscar todas vossas moedas de um e dois cêntimos.
Ainda não percebi porque não declaramos falência, se estamos na bancarrota? Porque razão se usa a expressão "ajuda externa", quando não se trata de nenhum tipo de auxílio, ou porque se diz que o fundo é de estabilidade, se a única coisa estável dentro de um buraco é a terra que nos vão deitando em cima. Espremei até à ultima gota depois de chuviscar e esperai por um duende com um pote de ouro no fim do arco-íris. A sério que eles existem.

Sinead O'Connor & the Chieftains - The Foggy Dew

Imagem: RoadKill

terça-feira, 15 de março de 2011

Tasuke te

Tasuke te (助けて) - "Ajuda!"
De uma forma geral, não apoio causas de solidariedade por ninguém. Mas neste caso abro uma excepção. Um povo que nos últimos dias sofreu terramotos (um mega sismo de grau 9, dois de grau 7 e cerca de trinta de grau 6), tsunamis, a ameaça de desastre nuclear, uma erupção vulcânica e, mesmo assim, no dia a seguir consegue continuar a acordar e a ir para o trabalho, não é para qualquer um e deve-se dar valor.
Nem sequer vou tentar estabelecer paralelos connosco, porque não existe padrão ou medida de comparação possível.

Imagem: Help Japan Posters, através do Der Terrorist, e visto anteriormente em dezenas de Tumblr

segunda-feira, 14 de março de 2011

Sinto-me com o Cio...

Sasha Grey, como Malice em Malice in Lalaland

Assim a modos que por uma Alice, mas mais marota!

domingo, 13 de março de 2011

Homens à Bruta

Ó Jel... ou melhor... Ó Nuno, não vales a ponta de um corno! Isto resumindo, para evitar escrever os impropérios a que terias direito.
Existe um princípio inerente à manifestação que parte do senso comum: Os manifestantes fazem a sua marcha na cadência que eles pensam ser a apropriada. Nunca se deve forçar as pessoas, pois estas estão lá de livre e espontânea vontade a exercerem um direito básico de cidadania.
Estava eu perto da animação da Farra Fanfarra quando a carrinha de caixa aberta dos Homens da Luta tenta açambarcar, assim ao estilo dos banqueiros gananciosos, o espaço e o protagonismo que a fanfarra estava a ter na manifestação.
A carrinha de caixa aberta da Luta lá progredia sem qualquer tipo de respeito pelas pessoas que se encontravam à sua frente, e com batedores contratados, aos quais denominarei de Assalariados dos Homens da Luta, nos factos que vou passar a descrever.

Os Assalariados dos Homens da Luta (AHL) tentavam, sem sucesso, abrir caminho pelo meio da multidão, uma vez que esta estava demasiado compacta e a avançar demasiado lentamente para o protagonismo que os Homens da Luta procuravam. A Avenida da Liberdade era uma área densamente povoada de pessoas, mas infelizmente com pouca densidade de câmaras televisivas.
Um dos AHL's tenta desviar as pessoas para o lado, mas vê os seus esforços frustrados devido à já referida compactação de humanos à nossa frente.
Confrontando o AHL, e apontando para o pulso onde estaria o relógio que não uso, pergunto se eles têm alguma hora marcada para estar no Rossio, ao que o AHL me responde de uma forma atrapalhada que sim, e em seguida tenta intrujar, assim ao estilo do PM, qualquer coisa acerca do facto de que «eles» iriam cortar a energia (!?) se não chegassem depressa ao Rossio.

Nessa altura, perdi a calma - "Eles!" - "Mas «eles» quem?" - "Quem é que são «eles»?". O AHL, ao perceber que não está a falar com gente estúpida, tenta vagamente fugir à questão - "Eh pá... eles!". Por fim pergunto-lhe quem é que mandava ali, se éramos nós ou se eram «eles», fazendo um titubeante AHL compreender que os seus esforços seriam infrutíferos.
O escoamento à entrada no Rossio permite finalmente que a carrinha dos Homens da Luta consiga passar pela nossa direita. Nesse preciso momento, começo a ser empurrado por uma cambada de animais acéfalos, também designada por "público", que procura acompanhar a carrinha, mas consigo repor o meu espaço de segurança. A mesma sorte não teve uma rapariga que foi atropelada e espezinhada pelos ditos animais. Isto depois de eu lhes ter berrado para não terem pressa, e antes do megafone do Jel apelar ao "povo" para este ter cuidado com "a camarada que caiu".

Foi então que pensei que não me deveria ter preocupado com a brutalidade da polícia, mas antes com a brutalidade dos Homens da Luta. Foi a ganância em estar perto de uma câmara de televisão, que quase atropelava quem estava à frente da sua carrinha.
O cartoonista José Vilhena, na altura do PREC, afirmava que havia políticos que davam "o cú e cinco tostões" para aparecerem na televisão. Jel, tu dás o cú e cinco cêntimos! Finalmente lá tiveste a oportunidade para tocar a cançoneta em directo. Precário eras tu, quando enfiavas a mão no rabo dos bonecos dos políticos. Hoje são os políticos que enfiam a mão no rabo do boneco que tu és. Mas tu não te importas, desde que tenhas protagonismo televisivo.
Enfim. Estiveste mal, ó Jel. Foste promovido a prostituta mediática, daquelas mesmo reles, pela malta aqui do bairro. Mas não fiques preocupado, podes vir beber um copo com a gente na mesma!

sexta-feira, 11 de março de 2011

Magnitude

Os sismos estão de tal forma enraizados na alma nipónica que a narrativa de uma animação de 2009 parte da probabilidade de que um terramoto de elevada magnitude possa ocorrer em Tóquio.
Tokyo Magnitude 8.0 (東京マグニチュード8.0) descreve o que poderia acontecer nesse tipo de desastre natural, um sismo com um epicentro situado numa fossa oceânica a 25 km de profundidade.
A série em si é bastante emotiva e a descrição do fenómeno é bastante realista.

Apesar de ser um povo habituado às manifestações sísmicas, ninguém consegue estar verdadeiramente preparado para um terramoto como o que aconteceu agora em Sendai, no norte do Japão. Este sismo foi o mais forte a atingir o país desde que há registo, e o sétimo a nível mundial.

日本人にポルトガルからの抱擁

quinta-feira, 10 de março de 2011

Cinzas

A Situação abomina o protesto. As razões para a revolta contra a precariedade e os recibos verdes existem desde há mais de dez anos. Mas nos tempos do pleno emprego guterrista ninguém se preocupou com a talhada que o Estado tirava ao sangue dos trabalhadores, ou pelo menos não existia esta congregação de vontades a dizer que já basta. Que o tempo deles acabou.
A força conservadora da sociedade, aqueles que vivem de forma abastada devido ao facto de terem pisado pessoas com mais mérito, que foram empurradas para o exílio ou para a decadência, observa com variados graus de pânico a hipótese de uma convulsão social.
As quintas do Estado, como por exemplo a RTP, onde os Homens da Luta ganharam o Festival da Canção deles, já não são inexpugnáveis. Ganhar é a palavra certa. Não era suposto o prémio ser para eles e eles ganharam-no, devido à condescendência gananciosa com que a organização vê o seu próprio publico.

O Presidente da República procura capitalizar o descontentamento, cavalgando a onda de indignação que irá à rua este Sábado, tratando-se da pessoa com menos moral para fazer aquele tipo de discurso hipócrita, pois andou dez anos a destruir o arcaico sistema produtivo português, onde governou como quis e onde tentou suprimir todo e qualquer tipo de protesto.
Parece que a raiva demora algum tempo a crescer no coração das pessoas, ou então a falta de dignidade atingiu o limite do tolerável. Nós não aceitamos que nos digam que não temos direito ao mesmo tipo de vida que tiveram os nossos pais. Nós não aceitamos que existam parasitas no topo da sociedade constantemente a adiar-nos a vida. Nós não acreditamos em hipócritas. Nós não queremos esta Situação. Nós não aceitamos que nos mandem areia para os olhos e nos digam que a culpa é nossa porque nascemos numa determinada altura ou não votamos em parasitas. Nós não somos nenhum recibo!

Imagem: Luís Alves

segunda-feira, 7 de março de 2011

Estava eu sossegado...

A minha falta de compaixão pelos outros deve ser do excesso de chá preto que ando a beber. O Entrudo é um tempo onde nos transfiguramos de outra coisa. As suas máscaras servem para esconder o nosso Eu interior, ou por outro lado, para mostrar um tipo de Eu que está escondido do resto da sociedade, por ser tão bestial e horrendo, que poderia causar repulsa nas mentes mais civilizadas, chocadas com esse tipo de cadência primária e visceral.
A serpente sou eu, e não sou ao mesmo tempo, se é que me faço entender. A palavra "máscara" provavelmente deriva do latim mascus ("fantasma"), embora até a sua verdadeira etimologia seja uma incógnita. O seu uso ritual serve para expressar um determinado poder, como o de um avatāra das trevas e do caos. A palavra latina "persona" designa um tipo de máscara, que ressoava ("per sonare") com a voz do actor que a usava. Neste caso, um uivo.

Tudo isto para explicar que me sinto farto. Nem sequer vou perder tempo a pessoalizar ou apontar minudências, pois toda a podridão que nos rodeia está bem à vista de quem a quiser ver. Tudo o que me apetece é disparar o meu vazio interior, a minha energia negativa, na direcção de quem os provoca.
Concretizando. Está no tempo e na altura de fazer cair tudo pela base. De derrubar as hierarquias que se desresponsabilizam dos crimes que elas próprias cometem. De sagrar as elites que dominam em todos os quadrantes da sociedade. De alvejar os criminosos acima da lei, neste auto-intitulado estado de direito. De fazer tábua rasa. De incinerar todos os que nos imbecilizam e corrompem no fogo da nossa própria raiva. De fazer valer o sentimento de justiça. Mesmo que fiquemos sozinhos. A solução é simples e simplista: eles não se conseguem desviar das balas - É só puxar atrás e recarregar. "Deus criou os homens, Samuel Colt tornou-os iguais". Porque nós somos mais e eles sabem disso. Só precisamos de ignorar o medo e encontrar a motivação para lutar. Onde quer que ela esteja.

sábado, 5 de março de 2011

A festa da carne

Não entendo a razão do ódio que certas pessoas têm pelo Carnaval. A frase popular que eleva o facto de ninguém levar a mal, é apenas uma chamada de atenção para os excessos que se cometem, uma vez que esse é o verdadeiro espírito da data. Claro que qualquer pessoa leva a mal se for vitima de uma brincadeira mais idiota, uma vez que a serenidade cristã é algo que já não abunda na nossa sociedade. Mas o Carnaval é o excesso, uma vez que este serve para libertar as pulsões (é verdade, muitas vezes sádicas) do ser humano antes do recolhimento da quaresma.
Nos meus tempos de puto rebelde (mas será que alguma vez deixei de o ser?) esta data era mais agressiva na questão da deambulação alcoólica do que, por exemplo, a noite de final de ano, ou qualquer outra noite do ano, para esse efeito. A razão disso acontecer talvez esteja ligada às expectativas de desgraçamento inerentes ao Ano Novo, comparadas com as do Carnaval.

O Carnaval original português, o dos caretos, de forte conotação com os primitivos rituais de fertilidade, está em desaparecimento, embora ainda resista como herança cultural. Mesmo o Carnaval popular do século passado foi substituído por uma versão mais plástica e asséptica, que perdeu todo o seu sentido. Onde estão o ódio e as frustrações que as pessoas tentam exorcizar, se se chega a casa sem se estar imundo ou de cabeça partida?
Como se trata de uma festa visceral, dos prazeres da carne, o povo que veio a formar os brasileiros tratou de a levar ao limite da grandiosidade ao som do samba. O Carnaval de Veneza, mais refinado e civilizado, e onde os prazeres proibidos se escondem atrás de máscaras, biombos e dissimulação, não tem a espectacularidade quase doentia da celebração do corpo do seu congénere do Rio. Qualquer um que se lembre da Xuxa no topo do carro azul e branco da Beija Flor, algures nos anos noventa, ou mais recentemente, do tapa sexo virtual da Viviane Castro, sabe que este é outro tipo de carne.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Serpentes num jardim de Jasmim

Naja egípcia, na Jemaa el-Fnaa, Marraquexe

A melhor maneira de analisar o Norte de África é através da distribuição da Naja egípcia (Naja haje). Quase todos os comentadores, analistas e bloggers falam ou escrevem sobre o Egipto e a Líbia com uma certeza tal que me deixa perplexo, e assim, embora a minha ignorância sobre o assunto em apreço seja avassaladora, não poderia deixar de dissertar sobre a complexidade geopolítica do mesmo. Caso não o fizesse, seria certamente acusado de cumplicidade com regimes ditatoriais e despóticos, qual ser abjecto sem respeito pela humanidade. Embora esta última consideração possa não andar muito longe da verdade.
Ontem, ao ler um texto do MEC (esse escritor tão sobrevalorizado da nossa praça), não pude deixar de pensar que nunca devo ter utilizado a palavra "perfídia" (e que palavra tão bela é) em nenhum texto. Como gostaria eu de ter utilizado a palavra "perfídia", embora nunca tivesse conseguido encontrar maneira de a entalar em nenhuma prosa de autoria. Houvesse maneira da palavra "perfídia", tão bela entre as demais, caber em tal pedaço de retórica, e estaria muito mais desinquietado sobre o facto de a ter de explicar.

Vamos ao que interessa - a cobra egípcia. O meu conhecimento das serpentes do Norte de África (ver aqui a bela prosa deste escriba sobre o assunto) é limitado à víbora de cornos (Cerastes cerastes). Esta não deve ser confundida com a víbora do deserto (Macrovipera deserti), uma áspide de tromba achatada que vive na Líbia, na Tunísia, possivelmente na Argélia, e que, conjuntamente com os americanos, deve ser a responsável por toda a sublevação a que temos assistido nos últimos tempos.
Ainda me lembro, porque não foi há muito tempo, de ler sobre o desinteresse dos media nacionais no problema da Tunísia, quando este começou. De facto, o Egipto chamou a si todas as atenções. Na minha opinião, pela particular característica da sua serpente nacional não ser uma víbora (apesar delas habitarem por lá) mas uma naja, e qualquer pessoa que saiba um pouco sobre o Hinduísmo tem a noção de que se trata de um animal superior, quiçá tocado pelos deuses. Serpentes estas, que ocorrem numa faixa que se estende desde Marrocos a ocidente, até ao Iémen e Omã a oriente, e que não conhecem nenhuma fronteira pelo meio. Chamam os doutos a isto de "efeito de contágio". Mas no fundo, o que sabem eles disto?

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terça-feira, 1 de março de 2011

Ícone

Jane Russell (1921 - 2011)

Desde o western até ao noir, passando pela comédia musical, os filmes de hoje não seriam os mesmos sem a marca que ela deixou nos de antigamente. "The Outlaw" (1941) e "The French Line" (1953) foram dois filmes que provocaram escândalo devido à sua figura voluptuosa, e o amargo dos censores e de católicos.
Apesar do seu pensamento mais conservador em anos recentes, nunca deixou de causar controvérsia. A mesma controvérsia que a fez nunca querer desmontar da sela e seguir o caminho mais fácil.
A mesma sela de onde muitos de nós escorrega ao longo da vida.