Miley Cyrus
Agora que já escrevi esta declaração de interesses, vou indignar-me um pouco com o trabalho jornalístico da SIC em relação ao evento.
Apesar do jornalismo televisivo no nosso país ter uma qualidade bastante baixa, eu tinha, e ainda tenho, alguma consideração pela informação da SIC. Por isso mesmo, quando vejo um trabalho mal feito nessa estação, fico severamente mais chateado, do que ao ver, por exemplo, o mesmo estrume de reportagem na TVI.
Os exemplos que vou relatar em seguida, aconteceram na cobertura prévia do concerto da Miley Cyrus, artista norte-americana de plástico, no RIR. Não me vou embrenhar sobre as considerações que tenham a ver com a qualidade artística da música dela, uma vez que este texto não é para isso. Em vez disso, vou opinar sobre aquilo que eu penso que não deverá acontecer em jornalismo televisivo.
A primeira ligação ao recinto do evento encontrou este caro telespectador face a face com o jornalista Reinaldo Serrano (O Geraldo português, mal comparado). Repórter bastante conhecido nos tempos da Revolta da Ponte em 1994, altura em que 99,9% dos fãs da Miley Cyrus ainda não eram nascidos. Ficaram famosas as hilariantes agressões que sofria em directo por parte dos agentes da autoridade. Eram outros tempos! Agora já é mais complicado fazer este tipo de coisas, como se viu na manifestação deste Sábado.
Prosseguindo o tema, dizia o bom do Reinaldo, qualquer coisa acerca de um grupo juvenil do tempo dele, que eram os Pandilha. Quase que me derreteu o cérebro! Nem com uma tuneladora de alta tecnologia eu conseguiria lembrar-me disso! Provavelmente teria de explicar primeiro o que é o vinil, ou um disco de 45 rotações, mas é sempre bom existirem essas pessoas, que fazem a ponte entre o Passado e a Realidade, para sabermos onde é que estamos.
Mas isso nem sequer foi o caso pior. Quando o RIR necessitava da promoção, percebia-se que os apresentadores da SIC Radical tinham uma certa sensibilidade, que lhes permitia fazer o trabalho, para o qual, um tarefeiro da SIC Notícias, simplesmente não tem capacidade.
O repórter, que me escuso aqui a referir o nome, entrevista os jovens que estão junto às grades do palco. Até aqui nada de especial, mas eis que se aproxima de um grupo de jovens raparigas e lhes pergunta qual é a música preferida delas. Devido ao vasto e prolixo reportório da artista em questão, as moçoilas pré-púberes hesitam (a capacidade de raciocínio delas nestas idades é um pouco desconexa) afirmando em primeira instância que gostam de todas.
Nesse momento, vislumbra-se entre elas, a cabeça de um rapaz (a diferença de tamanho entre os sexos nestas idades é bastante acentuada) que repete incessantemente que é o tema "Party in the USA". Uma deixa, que o repórter utiliza para pedir às adolescentes para cantarem o tema, pensando que estas iriam grunhir qualquer coisa.
Demonstrando um profissionalismo atroz, estas olham umas para as outras e começam ao 1... 2... 3... e cantam o tema desde o princípio, diga-se em abono da verdade e da justiça, com uma afinação aceitável, respeito pelo tempo dos compassos, fazendo as pausas necessárias para que os versos, totalmente decorados, entrem no tempo certo e com uma dicção da língua inglesa que poderia servir de exemplo para a nossa classe política. Quando já se encontravam, penso eu, na segunda estrofe e se preparavam para cantarem o refrão (que é basicamente o tema, uma vez que se trata de música pop e pouco mais tem do que isso) o repórter resolve que já chega e agradece a colaboração.
Porque enfim, a SIC Notícias não é a Radical e o amadorismo pata-de-microfone não se coaduna com os dias e horas que as miúdas dedicaram a aperfeiçoarem os seus dotes musicais.
Por último, o caso mais triste. Mas que provavelmente foi feito sem intenção, ou sem que o seu protagonista, uma jornalista que entrevistava as famílias durante a tarde, se desse conta.
Perguntava essa repórter, a uma miudinha tão nova, que provavelmente ainda deveria ter a primeira dentição, o que a levava a gostar de Miley Cyrus. Ao que a petiz responde algo, como o facto de ela transmitir a mensagem que qualquer pessoa é capaz de poder fazer tudo neste Mundo. Vólei imediato da jornalista, a perguntar à pequena se esta acredita mesmo nisso, ao que a miúda responde que sim, entre gargalhadas.
Diria o bom senso, que este tipo de cinismo não deveria ser utilizado em alguém assim tão novo, e que é contraproducente estar a pisar os sonhos da juventude, mas isto sou só eu a franzir o sobrolho.
...e depois dizem que é a música que corrompe a juventude!
* Espero que o Jel não me processe pela inspiração abusiva do "Dá-lhe, Falâncio!"